domingo, 22 de novembro de 2009

MULHER BUNDA MOLE...


Belinha acordou às seis, arrumou as crianças, levou-as para o colégio
e voltou para casa a tempo de dar um beijo burocrático em Artur, o
marido, e de trocarem cheques, afazeres e reclamações.


Fez um supermercado rápido, brigou com a empregada que manchou seu
vestido de seda, saiu como sempre apressada, levou uma multa por estar
dirigindo com o celular no ouvido e uma advertência por estacionar em
lugar proibido, enquanto ia, por um minuto, ao caixa automático tirar
dinheiro.


No caminho do trabalho batucava ansiedade no volante, num
congestionamento monstro, e pensava quando teria tempo de fazer a unha
e pintar o cabelo antes que se transformasse numa mulher grisalha.


Chegando ao escritório, foi quase atropelada por uma gata escultural
que, segundo soube, era a nova contratada da empresa para o cargo que
ela, Belinha, fez de tudo para pegar, mas que, apesar do currí­culo
excelente e de seus anos de experiência e dedicaçãoo, não conseguiu.


Pensou se abdômen definido contaria ponto, mas logo esqueceu a gata,
porque no meio de uma reunião ligaram do colégio de Clarinha, sua
filha mais nova, dizendo que ela estava com dor de ouvido e febre.
Tentou em vão achar o marido e, como não conseguiu, resolveu ela mesma
ir até o colégio, depois do encontro com o novo cliente, que se
revelou um chato, neurótico, desconfiado e com quem teria que lidar
nos próximos meses.


Saiu esbaforida e encontrou seu carro com pneu furado.
Pensou em tudo que ainda ia ter que fazer antes de fechar os olhos e
sonhar com um mundo melhor.


Abandonou a droga do carro avariado, pegou um táxi e as crianças.
Quando chegou em casa, descobriu que tinha deixado a porra da pasta
com o relatório que precisava ler para o dia seguinte no escritório!


Telefonou para o celular do marido com a esperança que ele pudesse
pegar os malditos papéis na empresa, mas a bosta continuava fora de
área.


Conseguiu, depois de vários telefonemas, que um motoboy lhe trouxesse
a porra dos documentos.


Tomou uma merda de banho, deu a droga do jantar para as crianças, fez
a porcaria dos deveres com os dispersos e botou os monstros para
dormir.


Artur chegou puto de uma reunião em São Paulo, reclamando de tudo.
Jantaram em silêncio.


Na cama ela leu metade do relatário e começou a cabecear de sono.


Artur a acordou com tesão, a fim de jogo. Como aqueles momentos
estavam cada vez mais raros no casamento deles, ela resolveu fazer um
Último esforço de reportagem e transar.


Deram uma meio rápida, meio mais ou menos, e, quando estava quase
pegando no sono de novo, sentiu uma apalpadinha no seu traseiro com o
seguinte comentário:


- Tá ficando com a bundinha mole, Belinha... deixa de preguiça e
comece a se cuidar..


Belinha olhou para o abajur de metal e se imaginou martelando a cabeça
de Artur até ver seus miolos espalhados pelo travesseiro!


Depois se viu pulando sobre o tórax dele até quebrar todas as
costelas! Com um alicate de unha arrancou um a um todos os seus dentes
depois deu-lhe um chute tão brutal no saco, que voou espermatozóide
para todos os lados!


Em seguida usou a técnica que aprendeu num livro de auto-ajuda: como
controlar as emoções negativas.


Respirou três vezes profundamente, mentalizando a cor azul, e
ponderou. Não ia valer a pena, não estamos nos EUA, não conseguiria
uma advogada feminista carí­ssima que fizesse sua defesa alegando que
assassinou o marido cega de tensão pré-menstrual...


Resolveu agir com sabedoria.


No dia seguinte, não levou as crianças ao colégio, não fez um
supermercado rápido, nem brigou com a empregada. Foi para uma academia
e malhou duas horas.



De lá foi para o cabeleireiro pintar os cabelos de acaju e as unhas de vermelho. Ligou para o cliente novo insuportável e disse tudo que achava dele, da mulher dele e do projeto dele. E aguardou os resultados da sua péssima conduta, fazendo uma massagem estética que jura eliminar, em dez sessões, a gordura localizada.


Enquanto se hospedava num spa, ouviu o marido desesperado tentar
localizá-lo pelo celular e descobrir por que ela havia sumido.


Pacientemente não atendeu. E, como vingança é um prato que se come
frio, mandou um recado lacônico para a caixa postal dele.


- A bunda ainda está mole. Só volto quando estiver dura.
Um beijo da preguiçosa...



(Extraído do livro: *Este sexo é feminino /Patrí­cia Travassos).*

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